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“Você vai entrar na minha sala?”, disse a Aranha para a Mosca.

Este é o primeiro verso do famoso poema The Spider and the Fly, de Mary Howitt, publicado em 1828. É uma fábula moral que avisa crianças e jovens sobre os perigos de ceder ao apelo de estranhos. Também serve para alertar inocentes úteis sobre os riscos de alimentar a sedutora tecelã de armadilhas.

A lembrança me ocorreu em debates com pessoas de quem gosto profundamente. Na disputa entre Bolsonaro e o PT, a democracia já perdeu. Isto tem que ficar claro: as alternativas democráticas ficaram fora do segundo turno. Sem aprender a reconhecer o que é e o que não é democrático, nossa tragédia eleitoral não serve nem como recurso educativo.

Cada dia fica mais claro que, se o PT vencer, muitos inocentes de bom coração e má formação intelectual respirarão aliviados achando que salvaram a democracia, quando na verdade ajudaram a eleger e legitimar um Programa de Governo abertamente autoritário e viabilizaram a volta ao poder de uma quadrilha, em todos os sentidos.

O voto nulo e em branco, algo que nunca defendi, neste segundo turno talvez seja a única alternativa válida de protesto, a única forma efetiva de se dizer que não é possível escolher entre dois projetos autocráticos.

Mas voltemos aos que estão decididos a votar.

Bolsonaro tem aquela transparência dos brutos. Haddad e o PT, o enganador véu de discursos utópicos e práticas autoritárias.

Bolsonaro é um, o PT uma legião.

A estratégia do PT, embora arriscada, foi matar as alternativas do campo democrático e polarizar com Bolsonaro, apostando na repulsa ao fantasma de um golpe/governo militar ou de um governo alinhado com os militares.

Me recuso a fazer o jogo do PT. Me recuso a ser mosca em sua teia. Me causa espanto ver pessoas defendendo o PT como alternativa democrática. Não é. Repito: sem entender isto nossa tragédia eleitoral não serve nem como recurso educativo.

Outro detalhe importante: do ponto de vista da democracia e do estado de direito, o Programa de Governo de Bolsonaro é uma promessa clara de respeito à constituição, enquanto o do PT uma ameaça a ela. O de Bolsonaro promete paz, o do PT chama para a guerra.

Em 2017 publiquei um artigo chamado O Ovo da Serpente em que dizia:

(…) “O réptil já perfeitamente formado” estava evidente desde o momento em que Hugo Chávez começou a destruir a independência dos poderes venezuelanos, a adaptar a constituição a seus delírios messiânicos, à perseguir economicamente quem lhe fizesse oposição. Mas a esquerda aplaudia, em nome de um projeto chamado “Socialismo do Século XXI” gestado aqui no Brasil em um misto de congresso e “clube de amigos” chamado Foro de São Paulo.”

O artigo segue com a questão. Se tiver tempo, leia. O que interessa aqui é que “O réptil já perfeitamente formado” também está bem visível no programa do PT que, uma vez eleito, poderá dizer que seus projetos autocráticos foram igualmente eleitos. Lá está descrita a intenção de destruir o equilíbrio entre os 3 poderes e colocar em prática aqui o modelo de “democracia direta” de Hugo Chávez. Não é exagero. Não é força de expressão.

No curto prazo, nenhum dos dois ameaça seriamente a democracia ou os direitos individuais. Como diz Fernando Gabeira, citando Matias Spektor, da FGV, a sobrevivência da democracia não está ameaçada, mas a qualidade dela, sim. E isto já aconteceu, seja quem for o eleito.

Minha avaliação é de que Bolsonaro tem carisma, mas não tem herdeiros políticos nem um partido ideológico que leve mais longe suas ideias autocráticas. Na área econômica, as propostas de seu Plano de Governo estão no caminho certo.

Já Haddad é liderança de segundo escalão no PT, um partido ideológico que tem uma visão absolutamente errada da economia (ao menos a que está em seu Programa de Governo) e uma visão autocrática da política que o leva a se alinhar com todas as ditaduras mundo afora que sejam de esquerda ou que ataquem o “imperialismo” dos EUA.

Bolsonaro é autoritário, grosseiro e despreparado, mas não é e nem representa um projeto autocrático de longo prazo.

Já o PT, como sabemos, é mais refinado e sedutor, mas também autocrático e com um perigoso e insistente projeto de longo prazo.

 

Artigo de Paulo Falcão.